Para onde vão as folhas?


É outono no hemisfério norte e as folhas começam a mudar sua cor, apesar de ainda guardarem vestígios de seu verde original; a temperatura está caindo mais, dia a dia, a medida que uma nova estação, o Inverno, se aproxima. E, assim como a natureza, os seres vivos também se desenvolvem através de vários ciclos, ou estações.

Os ciclos ou etapas da vida humana envolvem aspectos biológicos e aspectos emocionais. Todas essas etapas são consideradas estressantes e afetam os relacionamentos familiares. Evelyn Duval, especialista em desenvolvimento familiar, faz uma análise dessas etapas, focando-as dentro do ciclo da vida. Os princípios gerais de sua teoria são que, cada família, casamento e indivíduo passa por certas transformações em sua trajetória. A entrada e saída de algum membro na família, por nascimento, morte ou separação, assim como o desenvolvimento físico e emocional, causam estresse nas relações. Cada ciclo se completa dentro de um período de tempo. Duval completa seu pensamento dizendo que, as aspirações individuais, as expectativas sociais e culturais e o amadurecimento físico, são fatores que afetam diretamente a evolução e o desenvolvimento das pessoas.

Tudo tem início com o nascimento. A chegada de cada criança, geralmente, traz felicidade e festa. Nessa fase, espera-se que tudo seja alegrias e sorrisos; as sementes germinaram e os flores desabrocharam; é a Primavera da vida, a fase de grande aprendizagem através das relações com os pais, irmãos e familiares. É nesse período que as crianças aprendem as regras de convivência familiar e social. Mas, elas se desenvolvem e crescem e seguem para uma nova e turbulenta fase, a adolescência.

Chegou o tempo das transformações, causando uma revolução familiar, e essas mudanças podem afetar a relação de seus pais. Nessa etapa do casamento o casal enfrenta preocupações e angústias devido à ocorrência de dois fenômenos: a adolescência dos filhos e a idade média do casal, que está entrando em uma fase mais madura. Nessa idade os pais percebem que a juventude está indo embora, e podem sentir a tentação de sair a sua procura; muitas vezes através de novas maneiras de se vestir, ou indo para uma academia em busca da antiga forma física, ou ainda percebem a necessidade de reiniciar seus estudos e quem sabe tentar uma nova careira profissional. O afastamento físico dos filhos adolescentes e a nova demanda afetiva que isso envolve deve servir para que o casal procure aprofundar sua amizade e companheirismo, porque é tempo de importantes redefinições na família, como: revisão das regras de funcionamento, a busca de uma comunicação mais adequada com os filhos e de envidar esforços para ajudá-los a desenvolverem sua independência de maneira responsável. E todas essas atitudes requerem a unidade entre os pais.

Após um período de turbulência, que é a a adolescência, vem a idade adulta. Essa é uma fase de grandes e importantes conquistas. Podemos comparar esse ciclo da vida com o Verão. Nessa etapa, as pessoas buscam a realização de seus sonhos e o alcance de seus objetivos emocionais e profissionais. É quando os jovens adultos buscam formar vínculos e se unem aos seus parceiros, gerando novas vidas que irão repetir os ciclos anteriores, no futuro É a fase de planejamento e organização de novas unidades familiares; também é o momento de ajustes de personalidades e estabelecimento de compromissos.

Mas, o relógio do tempo é inexorável, e assim como as estações do ano vão se transformando, os ciclos da vida também vão se sucedendo, um ao outro. Ao aproximar-se o fim do Verão, o vento frio do Outono começa a soprar forte, arrancando as folhas, agora amareladas, de seus galhos e levando-as embora em um rodopio constante. Mudanças à vista! É o tempo de profundas reflexões sobre a nossa finitude, e nos perguntamos: para onde estão indo as nossas folhas levadas pelo vento da vida?

Com a chegada do Inverno, as árvores já estão totalmente despidas de suas folhagens. Muitas pessoas comparam essa estação com a morte, e esse pensamento é como um espantalho assustador, que ameaça toda a alegria desse período da vida, que deveria ser o tempo de aproveitar a tranquilidade dessa etapa e saborear o resultado da colheita do último Outono.

Com o avanço do Inverno, o frio vai se tornando quase insuportável e a neve cobre a natureza com o seu manto branco. A sensação é de que tudo está morto; não existem folhas e nem frutos nas árvores. Apenas os pinheiros permanecem com o seu verde original, como atalaias avisando que a vida continua a pulsar. De maneira análoga, está se processando mais uma mudança de ciclo na vida familiar e individual. Com o passar do tempo, a agitação e o ruído dos filhos já silenciaram, pois eles se transformaram em adultos e saíram em busca de seus próprios caminhos. Agora, a família nuclear, virou família de origem de outros sistemas familiares, e o casal está sozinho, como no começo da vida a dois. Chegou mais uma vez a hora de novos ajustes e surge a necessidade de buscar novos interesses, novas amizades e a reaproximação com as antigas, e também de rever a utilização do seu tempo e desenvolver novas habilidades.

Mas, essa não é uma etapa só de perdas, porque a chegada de novos membros familiares, os netos, trazem muito alegria e nos passam a mensagem de que a vida continua. Infelizmente, tudo passa e nós também passamos. Essa etapa da vida, comparada ao Inverno, é marcada por muitas perdas importantes. A primeira delas é a aposentadoria que pode trazer a sensação de falta de sentido em existir. Depois, possivelmente, surgirão doenças e a perda de pessoas significativas para nós. O ciclo de vida do casal chega ao fim com a morte de um dos cônjuges. Mas ainda é possível olhar para trás e recordar as coisas boas que aconteceram até aqui.

Esse Inverno também vai passar. Mas, a pergunta inicial era: Para onde vão as folhas?

Mesmo no rigor do Inverno, quando a neve dá um intervalo e o gelo endurecido no chão derrete um pouco, é possível ver resquícios das folhas arrancadas pelos ventos do Outono se desintegrando no solo e se misturando à seiva de vida que irá preparar a natureza em sua renovação, na próxima estação. E assim como a natureza renasce a cada Primavera em uma explosão de vida e de cores exuberantes nas árvores, plantas e flores, a vida humana também renova os seus ciclos através das gerações que se sucedem. Do mesmo modo, cada um de nós, como aquelas folhas, vamos reviver na nossa descendência, através de nossas contribuições, seja nos exemplos com nossas ações, ou com os ensinamentos que lhes repassamos. E então acontece o milagre da vida! E os ciclos recomeçam…

Albertiza Mitozo Ferreira
Psicóloga CRP 20/0316

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